O Encontro de Santarém, ocorrido 50 anos atrás no mesmo local onde de 6 a 9 de junho é realizado o IV Encontro da Igreja na Amazônia Legal “é expressão de gratidão a Deus por ter encorajado tantos irmãos leigos e leigas, religiosos, religiosas, padres, bispos, a adentrarem nas diversidades desta Amazônia com a missão de anunciar e testemunhar Nosso Senhor Jesus Cristo e sua obra missionária”, segundo Dom Irineu Roman. As palavras do Arcebispo foram referendadas pelo prefeito local, que ressaltou o legado da Igreja católica no município de Santarém.
Por Luis Miguel Modino
Um encontro que deu início a uma caminhada que hoje continua, aspecto destacado por Dom Mário Antônio da Silva, Arcebispo de Cuiabá, que chamou a continuar sendo como Igreja “encarnação na realidade e evangelização libertadora”, em uma caminhada em rede, atitude presente na caminhada da REPAM. O vice-presidente da CNBB chamou a “prosseguir unidos na defesa da vida humana e toda a Criação”, e junto com isso a “proclamar ao mundo a Boa Nova da ecologia integral”, que definiu como prioridade da vida humana para o cuidado da casa comum e de todos os seus povos.
Santarém foi um momento importante para toda a Igreja brasileira e celebrar seu Jubileu de Ouro “contribui para reacender ainda mais forte em todos nós o compromisso assumido por nossa Igreja há 50 anos”, segundo Dom Walmor Oliveira de Azevedo, que enviou mensagem de vídeo. O Presidente da CNBB destacou a importância do Concilio Vaticano II e da Conferência de Medellín, vendo no Documento de Santarém um instrumento para uma evangelização da Amazônia que respeita as culturas dos povos originários e está ao serviço da preservação da Amazônia.
O Encontro de Santarém celebra 50 anos em um momento desafiador, segundo Dom Walmor, que denunciou o desmatamento e chamou a uma reação missionária da parte da Igreja da Amazônia, tendo como base o Sínodo para a Amazônia e na perspectiva do Sínodo sobre a Sinodalidade. Um tempo de desafios, mas de esperança, onde sob a proteção de Nossa Senhora de Nazaré, “saibamos escutar as indicações preciosas do Espírito Santo de Deus para novos passos missionários, essenciais para o compromisso de preservar e defender a Amazônia”.
Como “uma pequena assembleia sinodal” definiu Dom Leonardo Steiner o IV Encontro da Igreja católica na Amazônia Legal. O presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia da CNBB vê o Documento de Santarém como “um texto muito simples, mas muito prático em termos de evangelização”. Dom Leonardo agradeceu a equipe de preparação de um encontro que quer fazer memória, presencializar, uma memória que é feita depois do Sínodo, “fruto do caminho iniciado em Santarém”.
A partir do Documento, o Arcebispo de Manaus chamou a “buscarmos de novo os elementos que possam ajudar nossas Igrejas particulares nesse caminho de uma profunda encarnação”, para que “a Igreja possa visibilizar o Reino de Deus”, e promover, partindo do Sínodo para a Amazônia, uma evangelização libertadora, que leve em conta os sonhos da Querida Amazônia.
No IV Encontro da Igreja católica na Amazônia Legal se fez presente através de uma mensagem o Papa Francisco, que vê esse encontro como “motivo de especial alento”, considerando-o “ocasião de intensa ação de graças ao Altíssimo pelos frutos da ação do Divino Espírito Santo na Igreja que está na Amazônia – durante estas últimas 5 décadas – e por quanto a mesma inspira”.
Ele destacou que “as intuições daquele encontro serviram também para iluminar as reflexões dos padres sinodais, no recente Sínodo para a região Pan-Amazônica”, alegrando-se “pelo empenho das Igrejas Particulares da Amazônia Brasileira, por meio de suas comunidades, em levar adiante as indicações da última Assembleia Sinodal”. Ele pediu aos participantes que “sejam corajosos e audaciosos, abrindo-se confiadamente à ação de Deus”, e através do Espírito, “anunciar o Evangelho com novo empenho e a contemplar a beleza da criação”.
Um encontro que acentuou uma Igreja com rosto amazônico, segundo Dom Erwin Kräutler, que se fez presente no encontro virtualmente. O Bispo emérito da Prelazia do Xingú recordou os principais aportes de Santarém, que inspirou as linhas prioritárias da pastoral da Amazônia: encarnação na realidade, pelo conhecimento e contato com o povo, na simplicidade, que se aprende do povo, e a evangelização libertadora, destacando o papel fundamental dos leigos e leigas engajados, que levou a insistir na formação das lideranças locais.
Uma experiência pascal, um passo que a Igreja Católica está dando, “passando do local para o universal, da Amazônia para a Igreja Universal”, nas palavras do Cardeal Barreto. O Cardeal peruano compartilhou como “este Kairos da catolicidade, da universalidade” está sendo vivido, chamando a “olhar com os olhos de Deus e nos deixarmos olhar pela Amazônia”, um olhar que vem dos povos que habitam a região. Após recordar e agradecer ao Cardeal Hummes por seu trabalho na Igreja da Amazônia, ele destacou a gratidão e a profecia como elementos fundamentais que animam um caminho sinodal que deve levar à escuta, ao discernimento e à ação conjunta.
O Documento de Santarém marcou a caminhada da Igreja local, segundo a Ir. Marlene Betlinski, administradora paroquial da Área Missionária Santa Clara, na Arquidiocese de Santarém, uma ideia reafirmada por Dom Mário Antônio da Silva. Mas também marcou a vida do povo, segundo testemunhou Felício Pontes, partindo de sua própria experiência, que destacou a importância dos leigos na capilaridade da Igreja e da defesa dos direitos humanos na Amazônia.
Na coletiva de imprensa, Dom Mário Antônio chamou, partindo de Santarém, DNA da sinodalidade na Amazônia, a avançar desde os sonhos da Querida Amazônia para buscar uma possibilidade maior de encarnar o Evangelho e assumir a evangelização libertadora. Uma encarnação que nasce da escuta, modo de aprender como levar Jesus, segundo a Ir. Marlene, que chamou a uma conversão para superar o clericalismo, fundamentada na escuta e no diálogo. Também surge de Santarém a formação como prioridade, holística, além da Igreja, segundo Felício, que ajudou a ir conhecendo o que a Ditadura tratava de ocultar. Um desafio que se torna atual, segundo o Procurador da República, sendo uma possibilidade para isso a Campanha “Eu Voto pela Amazônia”, que leve a abrir os olhos para reconhecer os lobos que devoram a Amazônia sem nenhum escrúpulo, segundo insistiu Dom Mário Antônio da Silva.
Na Igreja da Amazônia a realidade sempre tem sido um elemento fundamental, a partir do qual construir os caminhos. Santarém é um claro exemplo disso, que teve como consequência um documento onde essa realidade social e eclesial é recolhida claramente. 50 anos depois, a realidade sócio-política na Amazônia é desafiante, segundo Luís Fernando Novoa, algo que se concretiza em grandes projetos que chegam para destruir a Amazônia, soberania privada acima da soberania social, desafiando a Igreja católica a negociar uma trégua que evite essa destruição da Amazônia. Diante disso a Igreja tem que ser parceira, acreditar nos pequenos, nos pobres, fortalecer uma sociedade além do mercado.
Na análise de conjuntura eclesial, Dom Leonardo Steiner partiu do Documento de Santarém e da Querida Amazônia, questionando: “Como estamos hoje como Igreja na Amazônia?”, e desafiando os participantes do encontro a tentar “nos situarmos como o fizeram os irmãos há 50 anos”. Seguindo o Documento de Santarém foi analisando os passos a serem dados para concretizar suas linhas prioritárias: Encarnação na realidade e Evangelização libertadora.
Em relação com Querida Amazônia insistiu em que os sonhos são dimensões de uma única realidade, de um todo, um chamado à Igreja a ser presença em cada uma das realidades, a incultura-las, chamando a ir ao encontro para descobrir o que é mais significativo. Entre esses elementos significativos alguns foram compartilhados em diferentes testemunhos dos participantes do encontro.
Uma jornada encerrada com a celebração Memorial dos 50 anos do Documento de Santarém, com a presença do povo da Arquidiocese na Igreja de São Francisco. Um momento para lembrar um Documento que tornou a Igreja uma rede de comunidades e uma das maiores defensoras da vida dos povos originários, do direito à terra, dom de Deus para todos seus filhos e filhas. Um momento em que Dom Leonardo Steiner, presidente da celebração, chamou a ser cada vez mais sal da terra e luz do mundo, aquilo que ajuda a saborear a vida a se admirar com um mundo cheio de vida.
Fonte: REPAM-Brasil