A situação é crítica e não adianta reclamar apenas 24 horas por dia, todos nós sabemos quais são as causas do aquecimento global e das mudanças climáticas já devidamente anunciadas e conhecidas e nada é feito, lamentavelmente.
Por Juacy da Silva *
Sobre esta onda de calor aí no Brasil, em especial em MT e em Cuiabá, meu último artigo “Calor infernal no Brasil”, desta semana, que já está sendo publicado em alguns veículos de comunicação, é exatamente sobre isso. Uma sugestão, quem puder anote cada dia quais as três capitais mais quentes do Brasil, em 80% do ano Cuiabá ganha o troféu.
O aquecimento global é um fato e está acontecendo em ritmo mais acelerado do que há alguns anos ou décadas até mesmo os cientistas imaginavam, na verdade é um grande desastre ecológico anunciado e está igual a uma locomotiva desgovernada, ninguém consegue parar.
Aquecimento Global
O Painel da ONU sobre o clima, integrado por milhares de cientistas e pesquisadores renomados e experientes de diversos países têm produzido anualmente seus relatórios, com dados e informações científicas que demonstram que a temperatura média do planeta está aumentando rapidamente nos últimos anos e foram estabelecidas várias medidas no Acordo de Paris e nas Conferências do Clima (COPs), indicando dois parâmetros aumento de 1,5º grau até 2040 ou 2,5º por volta de 2060, tendo com base a temperatura média do início do período da industrialização.
O mais grave é que há poucos meses este PAINEL da ONU, deu uma notícia nada animadora, que a previsão de que a temperatura esperada para 2040 deve acontecer em 2028 ou até 2030, quando encerra os 15 anos dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, cujas metas parecem que poucas serão atingidas, ficando tudo no papel e nas discussões e nos famosos “protocolos internacionais”.
Além desses parâmetros, ou seja, se o aquecimento global superar esses limites as condições de vida no planeta terra vão se tornar insuportáveis e os desastres “naturais”, provocados pelas ações humanas serão devastadores, colocando em risco todos os tipos de vida no planeta, inclusive a vida humana.
Acordos ficam nos discursos oficiais
Os países firmaram o acordo de Paris e se comprometeram a realizar ações, políticas públicas que barrem ou reduzam os fatores, as causas do aquecimento global como desmatamento zero, lixo zero, queimadas zero, degradação do solo e contaminação das águas zero, poluição urbana zero; uso de combustíveis fósseis zero e tantas outras medidas.
Mas a grande maioria dos países, inclusive o Brasil não tem cumprido com as metas estabelecidas e firmadas solenemente, com muita pompa e fotos oficiais, enfim, os acordos e compromissos ficam apenas nos discursos oficiais e nada acontece. É um grande show de mentiras e demagogia apenas.
Enquanto não pararem com o desmatamento; com as queimadas, com a produção de mais e mais lixo, não dando destino correto ao mesmo; degradando os rios e todos os cursos d’água, usando excessivamente agrotóxicos e outros lixos tóxicos, tudo indo parar nos oceanos, a grande lixeira e o grande esgoto do planeta, enquanto a mineração e os garimpos ilegais continuarem deixando um rastro de destruição e mortes, enquanto a frota de veículos movida a combustíveis fósseis continuar aumentando e poluindo, tornando o ar irrespirável, enquanto os governos da quase totalidade dos países continuarem subsidiando os setores de energia, agropecuária, o setor de transporte e logística que usam petróleo, gás natural e carvão, grandes poluidores do planeta e uma das principais fontes de gases de efeito estufa, enquanto assistimos ao grande desperdício de alimentos e tantas outras matérias primas que fazem parte do do processo de produção de bens e serviços e que ajudam a destruir a natureza, enfim, enquanto vemos, sentimos os efeitos das mudanças climáticas e continuarmos, passivamente, alienadamente, irresponsavelmente e até de forma conivente com com tudo isso, iremos sofrer com as consequências do aquecimento global e das mudanças climáticas.
Mas em meio a este desastre continuamos eufóricos, imaginando que o Brasil é uma ilha exuberante neste planeta doente, porque somos um país “abençoado por Deus”, a Amazônia é o pulmão do mundo, o nosso Pantanal é exuberante, nosso povo é maravilhoso, nossa criatividade é imensa, o nosso agro é tech, é pujante e vai de vento em popa, estamos alimentando bilhões de pessoas no mundo.
Denúncias e ações são ignoradas ou até criticadas
Esta conversa de ecologistas, ambientalistas, defensores de macaquinhos, tartarugas ou indígenas e quilombolas, tudo isso é coisa de comunista, socialista, gente que quer atrapalhar o progresso e o desenvolvimento ou de ONGs que estão a serviço de outros países.
Tanto os governantes quanto os empresários, as lideranças da chamada sociedade civil organizada e também, o que é pior, uma boa parte, talvez a grande maioria dos fiéis e hierarquia das Igrejas cristãs (Católica e Evangélicas) e a população em geral continuam nesta posição, tanto é verdade que a Ecologia Integral, a Encíclica Laudato Si, as Exortações e pronunciamentos do Papa Francisco em defesa da Casa Comum são simplesmente ignoradas ou até criticadas.
Ecologia Integral
Há poucos dias, 20 e 21 deste mês de setembro de 2023, ocorreu uma grande reunião de Reitores de Universidades Públicas e privadas da América Latina e do Caribe, inclusive várias confessionais, com PUCs e outras mais no Vaticano, quando o Papa Francisco anunciou sua nova publicação, na verdade um complemento e ampliação da Encíclica Laudato Si, demonstrando que apesar de as Igrejas Cristãs (Católica e Evangélicas) não terem abraçado com entusiasmo que merecia suas mensagens em defesa do meio ambiente, melhor dizendo, da Ecologia Integral e melhorar os Cuidados com a Casa Comum, o Papa não desiste e continua com suas exortações ecológicas.
Nesta reunião o apelo do Papa Francisco é que as universidades que trabalham com os jovens, abram mais espaços para incluir as questões ecológicas, não apenas em seus currículos, mas também que façam parte das Ações ecológicas, de sustentabilidade e nas mobilizações proféticas, ao denunciarem os crimes ambientais/pecados ecológicos e também formarem profissionais que possam contribuir na busca de soluções para este desastre anunciado.
“No dia 20/9, os reitores participaram do primeiro dia do “Encontro de Reitores de Universidades Latino-Americanas e Caribenhas: Organizando a Esperança”. Cerca de 200 dirigentes se reuniram no Instituto Patrístico Augustinianum, em Roma, para discutir temas centrais da Encíclica Laudato, documento escrito pelo Papa Francisco, que aborda questões relacionadas ao meio ambiente e à Casa Comum dos seres humanos. Foram organizados quatro Grupos de Trabalho (GTs) para debater e formular conclusões sobre os seguintes temas: crise ambiental: mudança climática; água e biodiversidade; crise econômica: tecnologia e tecnocracia; crise social: degradação social, iniquidade, debilidade da reação; crise cultural: desemprego e migração. O reitor da UFLA (Universidade Federal de Lavras) participou do GT sobre crise ambiental. As conclusões dos reitores foram apresentadas ao Papa no dia 21/9, no Vaticano. O Pontífice explicou que o encontro foi denominado “Organizando a esperança” porque as universidades trabalham com a esperança, ao lidar com um público majoritariamente jovem. Entretanto, ele considera que, para os jovens serem efetivamente a esperança do planeta, eles necessitam de uma formação que vá além da técnica, incluindo também aspectos humanos e ambientais. Por isso, a importância de criar uma grande rede com as universidades”. (Fonte: Reitores se reúnem com Papa Francisco para tratar de desafios globais – htpss://ufla.br 26/09/2023)
Laudate Deum
Esta nova publicação do Papa Francisco tem como título “Laudate Deum” e vai dar continuidade às suas demais exortações apostólicas que, além da Laudato Si ou como em Querida Amazônia ou em seus três “Ts”: Terra, Teto e Trabalho indicam os rumos que precisamos seguir com humanidade, “inquilinos” desta CASA COMUM, que precisamos cuidar melhor e não continuar destruindo como se existisse outro planeta para onde poderemos mudar quando este se tornar inabitável.
Esta é a realidade, tanto o Santo Padre quanto alguns “gatos pingados” dentro das Igrejas que tentam fazer algo que estimule e promova, de fato, mudanças socio transformadoras mais profundas, buscando novos paradígmas, não tem tido o respaldo necessário ou são simplesmente ignorados.
Precisamos primeiro reconhecer os nossos pecados ecológicos, nós cristãos, católicos e evangélicos, precisamos passar pela CONVERSÃO ECOLÓGICA, inclusive a hierarquia das Igrejas, de cima a baixo, condição para atingirmos a CIDADANIA ECOLÓGICA e, só então, seremos dignos do magistério do Papa Francisco e de tantos outros líderes cristãos e não cristãos ao redor do mundo, que insistem na necessidade de respeitarmos mais a natureza e estarmos mais comprometidos na defesa das obras da criação, onde “tudo está interligado”, inclusive as próximas gerações que também tem direito a um planeta saudável e sustentável, livre desta degradação generalizada que estamos assistindo.
Ver, sentir e agir
Costuma-se dizer que o ser humano é dotado de três capacidades ou habilidades fundamentais: Ver, Sentir e Agir e a Igreja Católica, há décadas tem enfatizado, principalmente nas pastorais sociais e também nas demais, o método baseado em três dimensões ou etapas: VER, JULGAR, AGIR e, mais recentemente, uma quarta dimensão CELEBRAR.
Na perspectiva do AGIR, podemos definir, pelo menos, cinco grandes blocos temáticos:
a) campanha massiva contra o consumismo, o desperdício que geram mais lixo/resíduos sólidos e degradam o planeta;
b) ações que, efetivamente, combatam todas as formas de desmatamento e queimadas e incentivo para aumentar a produtividade, recuperar as áreas degradadas e subutilizadas, incorporando-as ao sistema produtivo agropecuário e florestal, o reflorestamento e a arborização urbana
c) combate intenso contra o uso de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e seus derivados e o carvão), inclusive acabando com todos os subsídios a esses setores, inclusive o automotivo, com estímulo e incentivos ao uso de fontes renováveis de energia, principalmente a energia solar e eólica;
d) programas que estimulem a agricultura orgânica, a agroecologia e a economia circular, inclusive ampliando as ações relacionadas com a agricultura urbana e periurbana; e) intensificar o processo de educação ambiental libertadora, visando despertar e incentivar a consciência ecológica, a CONVERSÃO ECOLÓGICA e a Cidadania Ecológica.
Para que tudo isso seja possível, precisamos não apenas de orações, que são importantes e necessárias na vida das igrejas, da religiões ou filosofias, mas também de AÇÕES DE SUSTENTABILIDADE e de MOBILIZAÇÃO PROFÉTICA, como insiste a Coordenação Mundial do MOVIMENTO LAUDATO SI, para dar os rumos neste TEMPO DA CRIAÇÃO 2023, que dentro de poucos dias estará chegando ao fim.
* Juacy da Silva é professor titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Instagram @profjuacy