Participante da III Escola de Direitos da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, Belinda Jima partilha seu testemunho de defesa da vida no Calendário “Guardiãs do Território”.
Por Belinda Jima
Em nosso território de Condorcanqui, onde as comunidades nativas Awajún e Wampis vivem desde tempos ancestrais, um dos casos mais dramáticos em que os direitos humanos e a dignidade da mulher são violados é a impunidade em casos de violência e abuso sexual.
População vulnerável
Quando olho para a realidade do meu povo, vejo que nossas meninas e adolescentes são uma população vulnerável àqueles que se aproveitam de sua inocência para violentá-las e abusar delas. Em nosso território, elas são estupradas e não podem se defender. E quando essas violações ocorrem, elas não sabem a quem recorrer, sentem-se oprimidas e abandonadas porque não há instituições da justiça que atendam seus casos.
Quando ocorre um estupro, a família geralmente conversa com as autoridades para chegar a um acordo sobre um pagamento financeiro. Alguns pais, diante do estupro de suas filhas, veem isso como um negócio e fazem um acordo com os abusadores diante das autoridades comunitárias. Desta forma, a lei não é cumprida e as autoridades não cumprem suas funções.
Impunidade e injustiça
Me preocupa que esta forma de lidar com o abuso sexual seja uma prática comum, e a impunidade e a injustiça estejam se tornando habituais nas comunidades. Nossas meninas violentadas estão sofrendo danos irreparáveis. Quem as acompanha? Quem procura justiça para elas?
Elas sofreram um trauma que ninguém atende e, pior ainda, suas famílias se tornam cúmplices da injustiça porque concordam com o agressor, alguns até mesmo afirmando que este é o costume da aldeia.
Os pais que querem buscar justiça para suas meninas e querem que os abusadores sejam punidos deixam suas comunidades para a capital de província, sem recursos para viajar, alimentar-se e para viver na cidade.
Eles não encontram tratamento adequado para suas meninas nas instituições do Estado. Não encontram justiça, porque as autoridades não têm paciência e pedem dinheiro para que as queixas dos pais sejam ouvidas. As garotas sofrem violência durante os interrogatórios no processo judicial. Aqueles que deveriam estar encarregados da justiça fazem negócios com a dor das meninas e de suas famílias que buscam justiça.
Lutando por mudanças
Às vezes sinto que estamos num beco sem saída, porque há muita injustiça e o Estado não lida com esses casos de violência e abuso sexual como deveria. Mas continuamos a lutar para que esta situação mude, construindo espaços de treinamento, lutando contra o machismo, dando poder às mulheres, e denunciando os maus tratos e a rejeição por parte do Estado.
Temos que continuar exigindo justiça, mesmo que muitas vezes as autoridades não nos escutem e não queiram nos levar em consideração. Mas nós mulheres de Awajún e Wampis somos corajosas e temos direitos iguais aos homens. Está em nossas mãos continuar lutando para mudar esta situação de injustiça!
Calendário 2023: Guardiãs do Território
O Calendário “Mulheres da Amazônia 2023: Guardiãs do Território” confirma a sinodalidade e reflete sobre sua missão como mulheres defendendo a vida e lutando pela garantia dos direitos para as gerações futuras.
Este tema é expresso através da arte da fotografia com o testemunho de mulheres defensoras do território. Suas narrativas devem nos inspirar, gerando espaços para compartilhar vida e ações, e que estas gerem vida e transformação.
Clique aqui para acessar o calendário: Calendário 2023: Mulheres da Amazônia, Guardiãs do Território – Repam
Fonte: REPAM/Tradução: Irmão Hugo Bruno Mombach, FSC